O ÔNIBUS ESPACIAL, Parte 1.3 : a subida

Marcos Pontes
18/03/2007

A subida é rápida. Tão dinâmica que a tripulação é proibida de assumir o controle antes de 90 segundos de vôo. Seria um desastre, pois não temos reflexos suficientes para controlar a máquina nessa fase. Tudo deve ser feito automaticamente.

Perto do regime transônico, a potência dos motores principais é reduzida para aproximadamente 68%. Isso é feito para reduzir as cargas aerodinâmicas causadas pelas ondas de choque sobre o veículo durante a passagem da velocidade do som. Quando atingimos Mach 1.2 (1.2 vezes a velocidade do som nas condições de vôo) os motores são acelerados novamente. Isso ocorre aproximadamente ao cruzar 50 segundos de vôo. Os motores também são reduzidos na última fase da subida para evitar que a espaçonave ultrapasse o limite estrutural de 3 "g".

Uma falha de um ou mais motores principais nessa fase inicial do vôo é algo bastante crítico. A saída é prosseguir na subida e executar um perfil (apenas testado em simulação) que nos leva a uma altitude segura, ejetar foguetes de propelente sólido, manobrar para retorno, usar o combustível disponível no tanque externo, ejetá-lo e voltar para pouso no Centro Espacial Kennedy. Esse modo de aborto de missão é chamado, retorno para o ponto de lançamento (RTLS - Return to Launch Site).

O propelente dos SRBs (Foguetes de Propelente Sólido) termina em torno de 2 minutos e 12 segundos. Nesse momento, com Mach 4.5 e a 50 quilômetros de altitude, os dois foguetes são ejetados e caem no mar com pára-quedas, sendo resgatados por navios a cerca de 210 milhas da costa americana. Eles serão checados e utilizados para outras missões.

Agora o ônibus espacial consiste apenas do veículo orbital e do tanque externo, ligado à parte inferior da espaçonave e alimentando os três motores principais com um fluxo incrível de oxigênio e hidrogênio líquidos. O conjunto continua a ganhar velocidade e altitude. Há seis minutos e meio no vôo, estamos viajando a 15 vezes a velocidade do som e já atingimos 130 quilômetros de altitude. Já é possível ver a curvatura da Terra no fundo negro do espaço.

Na verdade, já estamos, oficialmente no espaço (acima de 100 km). Se um ou dois motores principais falharem nesse instante, há várias opções de pouso do outro lado do Atlântico, como Zaragoza na Espanha ou Benguirir no Marrocos. Outra opção possível, mais alta, é abortar para uma órbita (AOA -- Abort Once Around). Isto é, prosseguir para uma órbita de mínima altitude, circular a Terra uma vez e pousar na Califórnia ou Novo México, provavelmente. A opção mais cômoda, e disponível apenas no final da subida, é abortar para órbita (ATO - Abort To Orbit). Nesse caso, uma altitude mais confortável de órbita é atingida utilizando-se uma "queima de inserção" rapidamente ajustada dos dois motores de mudança de órbita (OMS - Orbital Maneuvering System) localizados ao lado do estabilizador vertical. Estando em órbita, o problema pode ser avaliado com mais calma e reavaliadas as possibilidades de pouso. Isso aconteceu com a missão STS-51-F em Julho de 1985, quando um dos motores principais falhou devido a uma pane de um sensor de temperatura.

A oito minutos e meio de vôo, próximo do término do propelente líquido (O2 e H2) do tanque principal, os motores principais são reduzidos e cortados. Isso é um ponto importante e comemorado do vôo. Ele é chamado "MECO" (Main Engine Cut-off). O tanque externo é ejetado vinte segundos depois, sendo filmado pela tripulação, enquanto o veículo orbital manobra e o calor da reentrada destrói a estrutura de alumínio do tanque. O tanque, destroçado, cai em local remoto do oceano. Seu custo é estimado em 50 milhões de dólares.

Nesse ponto, entramos em uma nova fase do vôo...a inserção.

Fica para a próxima semana!

Grande Abraço a Todos,
Marcos Pontes

Marcos Pontes
Colunista, professor e primeiro astronauta profissional lusófono a orbitar o planeta, de família humilde, começou como eletricista aprendiz da RFFSA aos 14 anos, em Bauru (SP), para se tornar oficial aviador da Força Aérea Brasileira (FAB), piloto de caça, instrutor, líder de esquadrilha, engenheiro aeronáutico formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), piloto de testes de aeronaves do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), mestre em Engenharia de Sistemas graduado pela Naval Postgraduate School (NPS USNAVY, Monterey - CA).

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